A Lei 14.133/2021, também conhecida como Nova Lei de Licitações e Contratos, trouxe consigo mudanças significativas no panorama das licitações públicas no Brasil. Nesse contexto o Art. 5º desde dispositivo legal estabelece que na aplicação desta Lei, serão observados os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da eficiência, do interesse público, da probidade administrativa, da igualdade, do planejamento, da transparência, da eficácia, da segregação de funções, da motivação, da vinculação ao edital, do julgamento objetivo, da segurança jurídica, da razoabilidade, da competitividade, da proporcionalidade, da celeridade, da economicidade e do desenvolvimento nacional sustentável
Importante destacar que a segregação de funções no processo licitatório é essencial para assegurar a transparência, a imparcialidade e a eficiência nas contratações públicas, contribuindo para a promoção da boa governança e o uso eficiente dos recursos públicos.
Nota-se que a segregação de funções é um princípio fundamental na administração pública que visa impedir que um mesmo servidor público acumule funções que sejam incompatíveis entre si, especialmente aquelas que envolvam risco de fraudes ou conflitos de interesse.
Na prática, isso significa que diferentes etapas do processo licitatório devem ser realizadas por servidores distintos, evitando que um único indivíduo tenha controle total sobre o processo.
O Art. 7º da Lei 14.133/2021 determina que caberá à autoridade máxima do órgão ou da entidade, ou a quem as normas de organização administrativa indicarem, promover gestão por competências e designar agentes públicos para o desempenho das funções essenciais à execução da Lei, além de que, a esta autoridade deverá observar o princípio da segregação de funções, vedada a designação do mesmo agente público para atuação simultânea em funções mais suscetíveis a riscos, de modo a reduzir a possibilidade de ocultação de erros e de ocorrência de fraudes na respectiva contratação.
Ao vedar a designação do mesmo agente público para atuação simultânea em funções mais suscetíveis a riscos, a lei busca reduzir a possibilidade de ocultação de erros e ocorrência de fraudes durante as contratações. Isso significa que a autoridade responsável pela gestão por competências deve observar criteriosamente a distribuição de funções, designando agentes públicos de forma a promover uma efetiva segregação de papéis, mitigando assim potenciais conflitos de interesse e garantindo a integridade do processo licitatório.
A implementação da segregação de funções nas Câmaras Municipais busca alcançar diversos objetivos importantes, entre os quais:
- Prevenir fraudes e atos de corrupção: Ao distribuir as responsabilidades entre diferentes servidores, torna-se mais difícil para um único indivíduo desviar recursos ou manipular o processo licitatório em seu favor.
- Promover a transparência: A segregação de funções contribui para aumentar a transparência dos processos licitatórios, pois torna mais fácil identificar e acompanhar as diferentes etapas do processo.
- Assegurar a impessoalidade: Ao evitar a concentração de poder nas mãos de um único servidor, a segregação de funções ajuda a garantir que as decisões sejam tomadas de forma impessoal e imparcial.
- Melhorar a eficiência: A divisão de tarefas entre diferentes servidores pode contribuir para otimizar o tempo e os recursos utilizados nos processos licitatórios.
Para implementar a segregação de funções de forma eficaz nas Câmaras Municipais, algumas medidas podem ser tomadas:
- Analisar as funções existentes: O primeiro passo é realizar um mapeamento das funções existentes no âmbito da licitação, identificando as etapas do processo e as atividades envolvidas em cada uma delas.
- Definir as áreas de responsabilidade: Com base na análise das funções, é necessário definir quais áreas de responsabilidade serão atribuídas a cada servidor. É importante que as áreas de responsabilidade sejam compatíveis entre si e que não haja sobreposição de funções.
- Emitir normas e instruções: As Câmaras Municipais devem emitir normas e instruções que detalhem as regras de segregação de funções, definindo claramente as responsabilidades de cada servidor e os procedimentos a serem seguidos.
- Capacitar os servidores: É fundamental oferecer treinamento aos servidores sobre os princípios da segregação de funções e sobre as normas e instruções da Câmara Municipal.
- Monitorar e avaliar: A implementação da segregação de funções deve ser monitorada e avaliada periodicamente para garantir sua efetividade e identificar possíveis falhas ou áreas de aprimoramento.
A implementação da segregação de funções nos processos licitatórios, conforme preconizado pela Lei 14.133/2021, torna-se um desafio singular para as Câmaras Municipais com quadros reduzidos de servidores, especialmente no contexto do Estado da Bahia, sendo assim alguns pontos adicionais devem ser considerados para compreender as dificuldades:
- Falta de pessoal: A escassez de servidores dificulta a divisão de tarefas em etapas distintas e compatíveis, conforme os princípios da segregação.
- Acúmulo de funções: Em cenários com poucos servidores, um mesmo indivíduo pode ser compelido a acumular funções incompatíveis, elevando os riscos de fraudes e conflitos de interesse.
- Sobrecarga de trabalho: A sobrecarga de trabalho, resultante da multiplicidade de funções, pode comprometer a qualidade das atividades e levar à exaustão dos servidores.
- Falta de expertise: A carência de servidores especializados em áreas específicas das licitações pode dificultar a implementação eficaz da segregação.
Considerando estas dificuldades e diante da necessidade de garantir a observância dos princípios constitucionais da moralidade administrativa e da segregação de funções, bem como da legislação específica que veda o acúmulo de atribuições incompatíveis ao mesmo agente designado para atuar em determinada fase do procedimento licitatório, a realização de concursos públicos se apresenta como a solução mais adequada para suprir a falta de pessoal qualificado nos órgãos do Poder Legislativo. Essa medida assegura a seleção de profissionais capacitados e comprometidos com a eficiência e a legalidade dos processos licitatórios.
No entanto, reconhecendo que a realização de concursos públicos pode demandar tempo e recursos, principalmente em situações emergenciais, a possibilidade de recorrer a termos de cooperação técnica com o Poder Executivo pode ser considerada como uma exceção à regra. Por meio desses termos de cooperação, o Poder Legislativo poderá contar com o apoio de servidores do Poder Executivo para desempenhar temporariamente as atribuições necessárias à condução dos procedimentos licitatórios, garantindo assim a continuidade e a regularidade das atividades, sem comprometer os princípios da legalidade e da segregação de funções.
Sobre essa possibilidade o Tribunal de Contas dos Municípios de Estado da Bahia, já se manifestou sobre o tema no PARECER nº 02058-22, conforme abaixo:
(…) as Leis que regulamentam as Licitações e Contratos Administrativos (n°s. 8.666/93 e 14.133/2021), vedam o acúmulo de atribuições incompatíveis ao mesmo agente designado para atuar em determinada fase do procedimento licitatório, sobretudo ante ao princípio constitucional da moralidade administrativa e da segregação de funções, dispostos no art. 37, caput, da Carta Magna c/c art. 5°, da Nova Lei de Licitações, respectivamente. Não obstante, na hipótese de o Poder Legislativo não dispor em seu quadro de pessoal, de servidores aptos para desempenhar as citadas atribuições, este poderá, em caráter excepcional, recorrer aos servidores do Poder Executivo, situação que não exclui a necessidade da realização do devido concurso público.
No entanto, é importante ressaltar que essa cooperação técnica deve ser realizada de forma transparente e dentro dos limites legais, preservando sempre a autonomia e a independência dos poderes envolvidos.
Em conclusão, a implementação eficaz da segregação de funções nos processos licitatórios das Câmaras Municipais representa um desafio relevante, especialmente em contextos onde há escassez de pessoal e acúmulo de funções. A Lei 14.133/2021 estabelece claramente a importância desse princípio para garantir a transparência, a imparcialidade e a eficiência nas contratações públicas. Diante dessas dificuldades, a realização de concursos públicos surge como a solução mais adequada para suprir a falta de pessoal qualificado, garantindo a seleção de profissionais comprometidos com os princípios da legalidade e da segregação de funções. No entanto, reconhecendo a urgência em situações emergenciais, a cooperação técnica com o Poder Executivo pode ser considerada como uma exceção à regra, desde que realizada de forma transparente e dentro dos limites legais. Em última análise, é essencial que as Câmaras Municipais priorizem a implementação efetiva da segregação de funções, buscando sempre promover a transparência, a eficiência e a integridade nos processos licitatórios, em conformidade com as disposições legais e os princípios constitucionais da administração pública.
Adm. Alexandre Curriel
Especialista em Controladoria Municipal, Administração Pública Municipal, Licitações e Contratos Administrativos, Direito e Gestão das Cidades
Controlador Geral do Município de Ubatã/BA
Diretor Conselheiro da União das Controladorias Internas do Estado da Bahia – UCIB
Membro do Núcleo de Estudos em Governança Pública do CRA/BA.